Procurando o mapa perfeito!*

Saudações a todos... 

Neste post vamos realizar uma breve discussão sobre a “perfeição” nos mapas que produzimos. Esse debate surgiu em uma aula de cartografia, onde percebemos as dificuldades de ter um produto cartográfico perfeito que, apesar dos avanços das tecnologias disponíveis, devem ser idealizados segundo a necessidade de representação do usuário, informações do tema tratado e das influências que o elaborador sofre em seu cotidiano.


Assim, é importante que antes de elaborarmos um mapa – ou outra representação espacial, devemos saber qual será o uso para este produto e quais os indivíduos que utilizarão o produto cartográfico criado. As possibilidades são grandes: monitoramento ambiental, segurança pública, transportes, manejo de recursos naturais, análises espaciais urbanas, etc. 

Com a utilização do mapa, o elaborador expressa, por meio de técnicas de desenho e um conhecimento das geometrias dos lugares, a representação dos objetos e fenômenos que se apresentam no espaço geográfico, que se dá de acordo com uma escala de trabalho, isto é, conforme um determinado “lugar” de onde se vê o fenômeno.


Todos os produtos cartográficos (croquis, globos, mapas, cartas, maquetes, plantas, imagens, etc...) nada mais são do que uma generalização, redução e simplificação da realidade, que tentam representar graficamente e simbolicamente o espaço real que se conhece ou que se tem a pretensão de explorar. Saber se localizar e transmitir com precisão sua própria localização em formato de mapas é uma das características da comunicação cartográfica que só os seres humanos possuem. 

Essa forma de comunicação é universal para os seres humanos, onde o leitor do mapa, independente do idioma ou país, reconhecerá as formas dos rios, estradas, cidades e outros objetos, de acordo com as percepções comuns que todos têm da superfície terrestre, assim sendo, de acordo com as formas, cores, texturas, orientações, que foram criadas por meio da padronização dos símbolos que simulam o que vemos no espaço geográfico.

Antes de mais nada, os mapas elaborados devem possuir informações mínimas dos objetos ou fenômenos que são representados, devem responder questões básicas para o leitor (O que? Onde? e Quando?), de forma que se tornem auto-explicativos, pois tratam-se de publicações independentes, ou que são direcionados ao entendimento de uma temática principal, que facilita sua leitura. 


Porém, desde antes de começar a elaborar um mapa é importante sabermos que, na cartografia, não existe um mapa perfeito, pois a representação do real nunca será completa, já que depende do conhecimento aprofundado de um lugar, que é visto de diferentes maneiras por seus usuários e quanto mais informações colocarmos no mapa, tentando abarcar toda a complexidade do real, mais estaremos “poluindo-o”, de tal forma que ficará ilegível pelo acúmulo de informações e simbolização excessiva.

Nesse sentido, como o espaço geográfico é dinâmico e não estático, o mapa sempre estará desatualizado, a partir de sua impressão, pois novos fenômenos, objetos, percepções e entendimentos surgem de acordo com o ponto de vista do usuário e de seu relacionamento com a paisagem cartografada. 

Assim, na análise de um mapa sempre notaremos ausências ou imprecisões quanto aos elementos principais, mais precisamente, problemas na: escala, orientação, projeção, fonte, legenda, título, no “corpo do mapa”, ou em outros elementos; pois a própria curvatura da Terra nos direciona a erros na localização de lugares ou na apresentação simbólica dos objetos e fenômenos, que não seguem perfeitamente as normatizações que as técnicas cartográficas sugerem, o que pode contribuir para a apreensão incorreta das representações do espaço geográfico pelos alunos/leitores/usuários.

A complexidade, ou facilidade, que o mapa terá dependerá, principalmente, de algumas especificidades:

1) Do nível cognitivo ou da formação escolar do usuário: isto é, da especialidade de cada mapeador saber distinguir o mapa produzido. Desse modo, um biólogo entenderá o mapa diferente do que um geólogo, geógrafo, engenheiro e assim por diante. A (multi, inter, trans) disciplinariedade dos mapas refletem o conhecimento de seu elaborador. Assim, quanto mais “treinada” a visão do mapeador/elaborador de mapas, mais complexo será o produto cartográfico produzido e vice-versa, daí teremos mapas simples e complexos para públicos diferenciados;

2) Das instituições, organizações e ideologias do elaborador: De alguma forma, direta ou não, todos os indivíduos estão vinculados a instituições/organizações políticas e ideológicas, que influenciam em suas práticas e, consequentemente, repercutem nos produtos e/ou atividades realizadas. O elaborador do mapa deve cultivar a prática da imparcialidade, para que seus mapas não sejam tendenciosos e partidários, mas que estimulem o sentido crítico de seus leitores na busca por um entendimento próprio dos fenômenos;

3) Das ferramentas (geo)tecnológicas (softwares e hardwares) disponíveis para a elaboração do mapa: É necessário enfatizar que existem diversos programas e equipamentos direcionados à elaboração e disseminação dos mapas. Se antes o usuário necessitava do estudo de campo para compreender o fenômeno estudado, nos dias de hoje as imagens de sensores remotos nos dão a capacidade de perceber objetos no espaço geográfico sem sairmos do laboratório, bastando somente a capacitação técnica para a manipulação das tecnologias. A precisão e a melhoria nas resoluções (radiométrica, temporal, espectral e espacial) possíveis pelo avanço da informática dos últimos anos e também da aeronáutica (com os satélites, aviões e os VANT**), tornaram-se aliados significativos que foram incorporados aos conhecimentos já produzidos pelas chamadas geotecnologias mais antigas (bússola, astrolábio, etc) e que vem influenciando diretamente na qualidade dos mapas produzidos e nas formações dos profissionais que trabalham na área (geo)cartográfica;

4) Do fenômeno ou objeto que está sendo representado: Um mapa ideal (e não perfeito) será reflexo da quantidade de informações já colecionadas sobre uma temática de análise. Dessa forma, quanto mais conhecemos um determinado tema, mais poderemos encontrar novas aplicações para o conhecimento reunido, isto é, se pouco se conhece sobre um determinado assunto mais limitada será a produção cartográfica sobre esse assunto. Quando escolhemos temáticas que já são conhecidas pela comunidade científica, por exemplo, torna-se simplificado o cruzamento de informações diversas, para a construção de novos conhecimentos, em que a formação do elaborador terá influencia direta na complexidade do produto criado;

5) Da capacidade de leitura e entendimento dos usuários: Os mapas elaborados não são feitos para o elaborador/mapeador ler, mas sim para um público-alvo de usuários, que tem necessidades especificas, estes últimos devem estar preparados para ler os mapas disponíveis, segundo o seu nível cognitivo (idade, grau de escolaridade, experiência de vida, etc), pois, dependendo da complexidade o mapa pode não atender as necessidades daqueles para o qual foi feito, ou pode ser simples demais para um leitor melhor preparado. É importante enfatizar que o avanço tecnológico por qual passa a cartografia – e outras ciências, não deve enfraquecer a análise crítica contida nos mapas, pois as chamadas geotecnologias – tecnologias de processamento computacional da informação espacial, tem a facilidade de produzir mapas de maneira mecânica, sem a análise crítica de seu formulador e/ou leitor.

Essas cinco características são fundamentais para que o mapa seja ideal ou adequado para um determinado uso. A perfeição não cabe ao elaborador de mapas, pois a realidade e seus atributos são muito maiores do que se pode colocar em uma folha de papel ou tela de computador. Ao mapeador resta a busca constante por um produto “mais bonito”, preciso e que agregue mais conhecimento, assim como a cartografia deve ser entendida, como arte, técnica e ciência.

Espero ter contribuído na leitura e entendimento dos mapas com este post. Desejo a todos boa sorte na busca do “mapa perfeito”, mesmo sabendo que jamais representaremos fielmente em um mapa tudo o que vemos na realidade.

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* Para melhor entendimento falaremos genericamente do “mapa” como representante de uma vasta gama de possibilidades de representação espacial e de produtos cartográficos, como o globo, maquete, planta, carta, imagem de sensores, modelos digitais, etc.

** VANT – Veículo Aéreo Não Tripulado.